Ex-seminarista paraense lança livro sobre casos reais de "padres gays"

Entre os entrevistados do livro, quatro são de pessoas que moram no estado do Pará.

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O historiador paraense Brendo Silva, de 31 anos, ex-seminarista, vai lançar em breve o seu livro "A Vida Secreta dos Padres Gays", que aborda os casos reais de padres que se relacionam com outros homens, tendo a sua experiência enquanto esteve no seminário de Ananindeua e São Paulo.

"A ideia surgiu da minha própria vivência. Com 14 anos entrei num seminário católico de Ananindeua e logo quando cheguei me deparei com um fenômeno: quase todos os padres e seminaristas eram gays. Talvez três fossem héteros, o restante, cerca de 12, todos gays", afirmou Brendo para o Roma News. "Decidi escrever porque a religião prega uma moral sexual que não condiz com a realidade. Qualquer pessoa informada sabe que escândalos sexuais são rotineiros na instituição", disse.

No livro, o escritor conta sobre a sua experiência que viveu nos seminários, em Ananindeua, região metropolitana de Belém, e em São Paulo, capital paulista, desde os seus 14 a 21 anos, onde relata situações como abuso de poder. Desde que anunciou sobre o livro, Brendo relata ter sofrido ameaças de pessoas religiosas. "Já esperava e sei que os dias que virão não serão fáceis, mas alguém precisa ter a ousadia de falar o que todo mundo sabe, mas ninguém tem coragem de expor", contou.

Brendo Silva com 20 anos, em 2013.

O autor entrevistou 15 pessoas entre padres, seminaristas e ex-seminaristas, no qual dois heterossexuais afirmam terem sofridos assédio. Segundo o paraense, o objetivo da obra é dar voz às pessoas que foram silenciadas, uma reparação à sua própria história, no qual afirmar ter sido perseguido quando não queria se relacionar com algum padre ou seminarista, e fazer com que a igreja escute seus membros.

"Quase todos os entrevistados disseram que não dá mais para igreja performar um papel social que favorece somente hipocrisia, briga por poder e uma falsa moral sexual. As pessoas querem estar mais integradas, trabalharem a questão da sexualidade com naturalidade e não um bicho de sete cabeças. Quando a instituição varre coisas sérias para debaixo no tapete, ela produz o escândalo. Se levasse a sério a formação dos novos padres, se lidasse melhor com a realidade, os escândalos seriam menores", comentou Brendo. "Meu objetivo não é tirar nenhuma pessoa física do armário, meu objetivo é tirar a igreja do armário", finalizou.

Na obra, há casos trazidos pelos entrevistados, além da própria experiência do autor, que afirma ter fotos dos encontros dos padres. Entre as histórias de Brendo que vão estar no livro há o relato da participação dele em uma "sociedade secreta gay" que existe dentro da igreja. "Participavam padres, religiosos e seminaristas, todos gays. Tinham estatuto, hierarquia, regras, encontros nacionais, entre outros. Cheguei a participar de um desses encontros no estado de São Paulo", relatou. Em entrevista para o livro, um padre, que não teve a identidade revelada, afirma que "gay vai indicando gay" para cargos importantes.

"Se tirassem todos os gays do clero e episcopado, sobrariam poucos. A igreja tira esses gays da posição de excluídos para uma posição de privilégio. O padre tem grande prestígio social e as pessoas o veem quase como um ser perfeito e santo, mas ele é apenas um ser humano e na maioria das vezes, um homem gay", disse Brendo.

Capa do livro

Entre os entrevistados do livro, quatro são de pessoas que moram no estado do Pará. "Alguns que estão em paróquias de Belém foram meus colegas da época de seminário. São gays, mas não sei informar se atualmente se relacionam com alguém. Alguns estão em paróquias muito famosas, com grande prestígio", afirmou.

"Minha pesquisa antecede a questão do celibato. Obviamente abordo levemente essa questão no livro, mas uma das perguntas motivadoras é: por que muitos gays vão para o seminário? Mesmo que se submetam ao celibato? Acontece que quem não entra no jogo muitas das vezes é excluído. Os héteros que convivia passavam por isso", finaliza.

Atualmente, Brendo Silva, além de ser historiador, é pedagogo, pós-graduando na área de Ciência da Religião, cursa jornalismo e deixou de frequentar a Igreja Católica. O livro está previsto para ser lançado no primeiro semestre de 2024.