Seu Amâncio, policial militar reformado, está em casa somente com a mulher, dona Anna, de 103, e as cuidadoras. Aos 100 anos, seu Amâncio se distrai durante quarentena fazendo aulas virtuais de teclado"Além do arco-íris / Pode ser / Que alguém veja em meus olhos / O que eu não posso ver". Cantar é apenas um dos talentos do seu José Amâncio de Almeida. Aos 100 anos, o policial militar reformado de Belo Horizonte aproveita a quarentena para aumentar suas habilidades e tem feito aulas virtuais de teclado.Seu Amâncio, ou Major, como é respeitosamente chamado, está triste durante quarentena por causa do novo coronavírus, já que está isolado de sua família, mas nem assim esmorece. Ele e a mulher, Anna de Almeida, de 103 anos, estão em casa somente com as cuidadoras. Os filhos, netos e bisnetos não podem visita-los, para a segurança deles."Uma tristeza. Parece que eu morri. A quarentena é um caixão, todo mundo engaiolado", disse o Major.Mas, logo na sequência, solta uma risada ao falar da convivência com a mulher. Com mais de 80 anos de casamento, dona Anna ainda olha para ele com olhos apaixonados."Tem pouco tempo [de casamento]", riu.Na rotina do casal, algumas atividades são diárias, como as orações e as novelas na televisão. Todos os dias, os dois conversam com filhos, netos e bisnetos por chamadas de vídeos feitas pelo celular. "Todo mundo com saúde", garantiu o Major.Seu Amâncio, de 100 anos, e dona Anna, de 103, enfrentam a quarentena longe da família, em BHWellen Sabrine Cardoso/Arquivo pessoalNascido em 2019, seu Amâncio disse que nunca passou na sua vida uma situação com a que estamos vivendo. Ele nasceu um ano após a pandemia da gripe espanhola."Nunca na minha vida passei uma tristeza dessa. E nem quero mais. É o fim do mundo, Nossa Senhora. Mas com Deus a gente aguenta", disse.O Major espera que todos saiam desta crise melhores."Eu acho que vai haver muita conversão [religiosa]. Nós estamos sentindo o peso da mão de Deus", comentou.Como militar, o Major garante que segue toda as orientações sanitárias direitinho. "Não dou trabalho. O militar sempre cumpre ordens", riu novamente.A companhia de dona Anna é silenciosa. Ela pouco conversa devido a uma demência, mas está bem de saúde. Eles assistem à televisão de mãos dadas, sinal do amor que chegou às Bodas de Carvalho.Talentoso desde sempre, seu Amâncio toca violão, cavaquinho, pandeiro e reco-reco. Agora, aprende mais um instrumento, o teclado. Mas nenhum dos talentos supera a voz.Emocionado, ele canta para dona Anna a música deles, ansioso com a chegada do dia em que vai poder se reunir com a família novamente."Além do arco-íris / Pode ser / Que alguém veja em meus olhos / O que eu não posso ver", chorou, enquanto os olhos de dona Anna brilhavam.
G1